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domingo, 16 de agosto de 2009

Dependência cínica

Corrupção é um vício! E dos mais graves e
pernósticos.
Quem começa tende a aumentar a dose até
perder a noção de ética, moral, realidade e humanidade.
Acostuma-se com o mau-cheiro e passa a
considerá-lo um suave perfume; prostitui-se, mas
se acredita puro e inocente; decai até rastejar na
lama, apesar de sentir-se no “topo da pirâmide”.
Digamos que gera uma “dependência cínica”.
A maior parte dos casos de introdução ao vício
da corrupção está no ambiente familiar. Há casos
seculares, passados de pai, ou mãe, para filho! Mas
nem só de corruptos com linhagem vive esse “grupo
de risco”. Ele é pródigo em aliciar novos adeptos,
normalmente já predispostos, por falha de caráter.
A análise dos ainda poucos casos expostos pela
mídia mostra que tudo começa inocentemente, com
as “caixinhas” e “agrados”. Depois, vem o suborno,
com seus muitos nomes e expressões, que vão
desde os tradicionais: “comissão”, propina,
jabaculê, “por fora”, “molha-mão”, “cala-boca”,
etc., até aos mais modernos, como: “consultoria” e
“reserva técnica”, por exemplo. Como em outros
tipos de vício, as desculpas para entrar são várias:
há os que dizem que aceitam corrupção porque
ganham pouco e precisam comprar o “leite das crianças”.
Dão ao ilícito uma conotação de carência
social. Só que, depois que a “dependência” se instala,
o vício continuará evoluindo mesmo que o
salário não seja mais problema. O “leitinho” vai
virar férias no exterior, carro importado, casa luxuosa,
conta bancária em paraísos fiscais... A partir
daí o “viciado” fará de tudo para manter o padrão
atingido, perdendo completamente a noção do
certo e do errado! A corrupção fará parte de sua
vida em qualquer lugar onde estiver: em casa, na
rua, no lazer ou num templo religioso.
Como qualquer outro dependente, o corrupto
acreditará que ninguém sabe de seu vício. Também
crerá que não está preso a ele e que poderá largá-lo
quando desejar. Então, sem perceber, exporá e até
viciará a própria família, tornando-a tão dependente
quanto ele. Criará a cultura do vício, do “todo mundo
faz!” e do “agora é minha vez!”.
Nas prateleiras da vida serão mercadorias sempre
à venda! [...]
O corruptor, adaptado aos modernos conceitos
de mercado, os chamará, às vezes, de
“facilitadores” _ das dificuldades que eles próprios
criam _, ou “lobistas” de um outro tipo de tráfico,
o de influência, que transforma cidadãos de
quinta categoria, moralmente, em elite. Alguns
corruptores até preferem trabalhar dessa forma, pois
cultivam um prazer sádico e também vicioso por
comprar pessoas ou tê-las “na palma da mão”. [...]
Só voltam à realidade, quando sofrem, eventualmente,
de uma “crise de abstinência”, ou quando
uma “overdose” os expõe na mídia.
Corruptor e corrupto no final das contas não
passam de faces opostas de uma moeda de duas
caras, descaradas. São componentes de uma mesma
“droga”, que lhes dá prazer e financia seus “baratos”
e “viagens”, enquanto a população que paga
a conta tenta ganhar a vida honestamente, trabalhando
dia e noite.
O problema, como sempre, é que tem mais
gente viciada do que pessoal disposto a combater e
erradicar o vício.
(GONÇALVES, Adilson Luiz. Jornal de Crônicas.

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